por Igor Yazon
Já há muitos anos que as províncias de Kivu do Norte e do Sul, no leste da República Democrática do Congo, continuam a ser zonas de violentos confrontos armados. Segundo algumas informações, aqui atuam pelo menos 30 grupos armados que lutam pelo princípio “todos contra todos”.
E onde existe guerra, existem vítimas entre a população civil dessas províncias. O mais horrível é o estupro em massa de mulheres, meninas e crianças. Mas mesmo com esse pano de fundo, uma especial crueldade e perversidade distingue os membros dos chamados “esquadrões de portadores de AIDS”, que transformaram esse vírus mortal numa arma de guerra, infectando deliberadamente as mulheres das comunidades inimigas.
Sobre os crimes perpetrados pelos “esquadrões de portadores de AIDS” falou com indignação a ministra-delegada encarregada dos Franceses no Estrangeiro e da Francofonia, Yamina Benguigui, que realizou recentemente uma viagem ao Burundi, ao Ruanda e à RD do Congo. Numa coletiva de imprensa realizada em Kinshasa, ela afirmou que os membros desses esquadrões infectam deliberadamente com o vírus AIDS as mulheres das comunidades rivais. De acordo com a ministra, dessa forma já se tornaram seropositivas várias gerações de mulheres no leste do Congo. Ela apelou à comunidade internacional para que esta se preocupe com o destino das crianças, meninas e meninos, condenadas a um longo sofrimento e a uma morte lenta. O politólogo congolês Lilo Mianga, editor principal da revista Ngambo Na Ngambo, explicou à Voz da Rússia como surgiram os “esquadrões de portadores de AIDS”:
“Realmente, a ministra falou disso, mas eu, ainda em 2000, chamei à atenção, num dos meus programas televisivos, para Mbarara, uma cidade no Uganda. Nessa cidade, mercenários europeus e africanos, juntamente com criminosos congoleses, resolveram criar os “esquadrões de portadores de AIDS”, para que os seus membros infectassem congolesas com AIDS.
“Mas esse filme acabou por nunca ser exibido. Eu tive ocasião de perguntar acerca disso ao então presidente do Burundi Pierre Buyoya. Na véspera eu tinha recebido a informação sobre esses crimes de um jornalista do Burundi, que não posso nomear porque ele teria grandes problemas no seu país, o qual também está envolvido nesses acontecimentos. Eu quis perguntar ao presidente do Burundi se era verdade que militares do Burundi e do Ruanda, doentes com AIDS, estariam a ser envolvidos nas operações militares no leste do Congo com o objetivo de infectar a população local através do estupro de mulheres. Isso representa um verdadeiro crime. Faz recordar as políticas de Hitler na Alemanha nazista que visavam destruir as crianças de outros povos para manter a pureza da raça ariana.
“Eu repito que nós falámos sobre isso ainda em 2000, mas o meu programa não foi transmitido em nenhum canal televisivo por razões que me são desconhecidas”.
Essa barbaridade continua, segundo o relatório do secretário-geral da ONU ao Conselho de Segurança, no período entre dezembro de 2011 e novembro de 2012, nas províncias de Kivu do Norte e Kivu do Sul foram registados mais de 500 casos de estupro. Lilo Mianga comenta:
“O Presidente Joseph Kabila, cujo exército está a desenvolver operações nas províncias de Kivu contra todo o tipo de grupos extremistas congoleses, incluindo o movimento M23, apoiados pelo Ruanda, está ligado por acordos secretos com os presidentes do Uganda Yoweri Museveni e do Ruanda Paul Kagame. Talvez seja por isso que Joseph Kabila nunca sequer referiu esses estupros. Nomeadamente, sobre os extremistas tutsis que, com o apoio do Ruanda, querem criar o seu próprio estado num território do tamanho da Bélgica.
“Essa máquina de guerra continua a funcionar e Kabila está encurralado pelos acordos assinados em Mbarara, por isso ele se remete ao silêncio. O Chefe de Estado é obrigado a jogar com as palavras para não denunciar esse segredo ao seu próprio povo que combate os extremistas. Ele nem sequer falou disso durante a sua intervenção na ONU. Infelizmente, a mídia norte-americana e europeia também votam essa história ao silêncio, o que é comprovado pelas minhas tentativas de falar sobre esses crimes. Parece que a mídia não confia na informação proveniente de África ou, simplesmente, nela não quer acreditar.
“Mas nós, os jornalistas independentes, tentamos procurar qualquer oportunidade para contar o que se passa no leste da República Democrática do Congo. Eu também sei que, quando em Genebra foi publicado esse relatório do secretário-geral, houve pessoas que tentaram retirar do relatório as páginas que relatavam as atrocidades dos extremistas. Mas eu acredito que os verdadeiros patriotas congoleses irão encontrar uma forma de parar essa guerra no leste da RD do Congo”.
Igor Yazon
VOR/UNO